Ética com os pés no chão (3/3)
É disso, justamente, de que se ocupa a Ética: como viver da melhor forma
possível consigo e com os outros. Nesse sentido a ética é uma ferramenta de
autoajuda como de cidadania e humanismo; uma disciplina prática de cunho
existencial e social, não um decálogo de mandamentos e interdições.
Quando o assunto é a vida, as pessoas reagem de forma distinta. Uns
acreditam que a conhecem o suficiente e se aventuram a dar conselhos a torto e
direito. Outros têm dúvidas sobre o significado de viver eticamente no mundo
moderno e evitam palpitar na vida alheia. E, por último, há uma minoria que
acredita que a vida não cabe numa fórmula única, existindo outras formas legítimas
de se viver.
Simpatizo com os últimos. Procuro não colocar o carro das respostas
antes do boi das questões. Não é sensato imaginar que possuímos uma resposta
inteligente antes de conhecer a situação concreta. Este é o maior defeito da
ética doutrinária: reivindicar a existência de um gabarito moral antes das
questões terem sido colocadas sobre a mesa.
Evite essa armadilha visualizando a Ética como um método de análise de
problemas e situações que busca promover valores e interesses comuns.1
Ou seja, antes de condenar ou absolver,
examine as questões concretas, identifique os problemas reais e potenciais, coteje as soluções possíveis, avalie as restrições e, aí sim,
defina um curso de ação que otimize os benefícios para as partes direta ou
indiretamente envolvidas.
O moralista, por exemplo, condena o ato de mentir e ponto final! Será? Uma coisa é mentir para tirar
vantagem ou prejudicar outrem. Outra coisa é mentir para salvar a própria pele
ou a pele da família. Se eu disser a um assaltante que não tenho família para
poupá-la, estarei agredindo a moral e os bons costumes?
Da perspectiva ética e do bom senso, a resposta é não!
O conceito mentira é fixo e condenável. Porém, a vida é mais complicada
a ponto de chegarmos a admitir que quem mente nem sempre está mentindo.
Bem, que tal menos abstração e mais fatos, mais vida e realidade e menos
conjecturas? Não chegaria a ponto de defender que os fins justificam os meios,
porém, defendo que a escolha inteligente é aquela que induz à ação que gera consequências
positivas para o maior número de pessoas, ou minimiza os danos para as pessoas
direta e indiretamente envolvidas.
Sim, caro leitor, a Ética exige sabedoria existencial que, por sua vez,
exige resultados palpáveis no lugar da retórica. Ser ético é ser capaz de
atingir os objetivos próprios e compartilhados.
Contudo, ética se faz com os pés no chão e com o entendimento de que na
vida real há santos, pecadores e pessoas que fazem o melhor que podem, apesar
dos deslizes que venham a cometer.
Ao referir-se à ética e responsabilidade, Peter Drucker citou o
juramento do médico grego Hipócrates: “Primum non nocere – Em primeiro lugar
não provocar danos conscientemente”.2 Afinal, acrescenta Drucker,
nenhum profissional, seja médico, advogado ou administrador, pode prometer que
nunca se equivocará. “Tudo o que ele pode fazer é tentar”.3
O fato é que a resposta nem sempre está no manual onde tudo é perfeito e
funciona como um relógio e, sim, dentro da nossa vida, vivida em todas as suas
nuances e contradições.
1. Ver, Pfister, Eugen, Ética:
pense duas vezes antes de agir, 2012.
http://ovelholobo.blogspot.com.br/2012/04/negocios-efilosofia-etica-penseduas.html
2. Drucker, Peter F, Gestão com Joseph A. Maciarelli; Rio de Janeiro, Agir, 210, pg. 331.
3. Idem.